É razoável afirmar que quase todo progresso no Brasil vem acompanhado de uma tentativa sistemática de minar esse mesmo avanço quando se trata de povos historicamente marginalizados e perseguidos. É uma concessão que o poder central faz porque foi obrigado a isso. É uma trégua bastante tênue. Um contrato social frágil que vive sob ameaça e pode ser rompido a qualquer momento. Nada ilustra melhor isso que a história dos povos indígenas e como a elite brasileira lidou, e lida, com suas demandas legítimas, urgentes e cruciais.
Foi assim desde a criação do Serviço de Proteção ao Índio (SPI) em 1910, substituído a partir de 1967 pela enfraquecida Fundação Nacional do Índio (Funai). O mesmo aconteceu com o Subsistema de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, instaurado em 1999 e mal gerido pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa), até a criação da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) em 2010, por pressão e mobilização, um avanço na independência e na integração do modelo de saúde praticado até então.
Esse avanço, contudo, vem sendo boicotado desde sempre. O controle social por parte dos povos indígenas não é respeitado; a privatização do serviço com contratação de profissionais por meio de organizações sociais que recebem bilhões do governo desvirtua o modelo pretendido; há sérias dificuldades de se conciliar métodos tradicionais dos povos indígenas com uma visão mais intervencionista e medicamentosa. Isso tudo acaba gerando um acúmulo de problemas e realidades muito diversas entre os 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI’s).
O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) procurou lideranças indígenas, profissionais de saúde, usuários do sistema e funcionários da Sesai para traçar um panorama da situação geral, os principais problemas a serem resolvidos e as soluções possíveis.
Não bastasse esse desolador quadro da saúde indígena, o atual governo editou em outubro passado, à revelia de consulta pública e das entidades envolvidas, a portaria 1.907/16, que acabava com a independência da Sesai – um ataque direto e severo do presidente Temer e do ministro Ricardo Barros (Saúde) à Secretaria, numa demonstração clara de que ambos desconhecem completamente o modelo adotado, suas especificidades, avanços e gargalos.
A Sesai conta este ano com um orçamento aproximado de R$ 1,45 bilhão, de um total de R$ 115,4 bilhões previstos para o Ministério da Saúde. Esse dinheiro mantêm o funcionamento dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs), que são divididos estrategicamente pelo país por critérios territoriais, não necessariamente por estados. Esses distritos têm como base a ocupação geográfica das comunidades indígenas. Sua estrutura de atendimento conta com postos de saúde e casas de Saúde Indígena. É presidida pelo recém empossado Marco Antônio Toccolini, ex-funcionário do governo Roseana Sarney (PMDB) no Maranhão, que substituiu Rodrigo Rodrigues, também vinculado ao PMDB e que não ficou sequer um ano no cargo. O criticado Antônio Alves, no entanto, foi quem liderou a Sesai desde a sua criação, de 2010 a 2016.
Para muitos, a gestão de Alves foi desastrosa e se caracterizou “pela paralisação dos programas de formação de Agentes Indígenas de Saúde e demais profissionais indígenas, destruição da autonomia dos conselhos distritais e das instâncias de controle social em todos os distritos, intensificação dos critérios clientelistas e de apadrinhamento político para os cargos de gestão e composição das equipes multidisciplinares de saúde, grave ineficiência na execução dos programas de atenção à saúde com piora acentuada nos indicadores de saúde, e total inoperância na execução nos investimentos na infraestrutura de saúde e no saneamento básico das comunidades indígenas”.
Coloque na conta também episódios de calamidade, como a situação no Alto Rio Negro, em Santarém e no oeste do Pará, fraudes milionárias identificadas pela Controladoria Geral da União e uma série de problemas crônicos que fazem com que a saúde indígena esteja, além de estagnada, em risco.
Para Maria das Graças Soares Araújo, a cacica “Nina”, do povo Katokinn, no alto sertão de Alagoas, e uma das lideranças do DSEI de Alagoas-Sergipe, a Saúde está um caos como um todo. “A nossa luta é para que comecemos a pensar e nos organizar mais e mais. Estamos sob ataque. Ou nós melhoramos hoje a política em si ou então continuaremos cada dia que passa com a saúde dos povos indígenas sendo tirada da gente”, afirma.
Jibran Patté, do povo Xoclengue de Santa Catarina, sabe bem o que é isso. Jibran é um Agente Indígena de Saúde (AIS), assistente social de formação, e trabalha há 3 anos na área. Falando como quem trabalha na ponta, afirma que a situação, em vez de melhorar, vem piorando em muitos lugares. Não apenas a saúde em si, mas a capacitação e a organização do sistema como um todo. “Muitas vezes nossos conselheiros não têm capacitação, não sabem de fato qual é o papel de cada um deles. Precisamos da capacitação dos novos conselheiros e dos profissionais indígenas. Hoje isso é voltado para a área técnica, e não para os indígenas que estão na linha de frente na aldeia. É preciso debater e insistir nesse assunto”, diz.
Jibran relata que problemas como alcoolismo, drogas e doenças sexualmente transmissíveis tem aumentado nos últimos anos e é preciso capacitação para enfrentá-los. Muitos profissionais são contratados com uma visão de saúde instrumentista, não levando em conta a saúde tradicional dos povos indígenas. “Hoje a Sesai tem deixado isso de lado porque é mais fácil comprar remédio do que trazer a saúde tradicional para o dia a dia do atendimento”, afirma. Além de uma prerrogativa da política, é comprovado que o atendimento integrado com a saúde tradicional indígena reduz a incidência de doenças nas aldeias. “É preciso fortalecer o controle social na capacitação e a transparência do recurso público, que muitas vezes fica à mercê dos caprichos e das necessidades do próprio gestor. Os indígenas devem estar à frente disso”, reivindica Jibran.
Controle social, situação heterogênea e ameaças internas: tensão constante na ponta e na SESAI
Rodrigo* atua na saúde indígena desde 2005. Trabalhou anos em DSEI’s na Amazônia e é funcionário da Sesai desde a sua fundação. Acompanhou, portanto, a mudança na política. Com a saída da Funasa e a criação de um órgão autônomo com maior integração com as políticas do Ministério da Saúde, todos ganharam, afirma Rodrigo. Assim, ficou mais fácil a participação em programas como o Brasil Sorridente, que criou seu braço especializado, o Brasil Sorridente Indígena e, posteriormente, a inserção de profissionais do Mais Médicos, que melhoraram imediatamente a Atenção Básica. Na avaliação de Rodrigo, mesmo considerando os avanços, muitos desafios permanecem, como estrutura, gestão e a autonomia realizada na prática. “Apesar de ter criado os distritos e comunidades autônomas administrativas, na prática isso não tem sido tão efetivo. Há um problema na deficiência de recursos humanos, na qualificação dos profissionais na parte de gestão e da fiscalização dos processos”, denuncia.
Em geral, a situação de cada DSEI é muito distinta, e as condições de saúde variam muito. “Isso se dá de forma muito heterogênea. Alguns estão organizados, outros não. Vemos hoje distritos que deram um salto e outros que estão piores, é bem específico de acordo com a região e depende de vários fatores”, diz. Algo comprovado pelos relatos diversos dos próprios indígenas. Para Alex Francisco Tupiniquim, da aldeia Pau Brasil, no município de Aracruz, no Espírito Santo, a situação está precária. “Não existe estrutura para atender as nossas demandas, falta remédios, profissionais e a situação geral é bem ruim”, afirma. Já para Debô Kayapó, de Redenção, no Pará, que não ignora a situação de outros povos que passam dificuldade, o trabalho feito na sua região está bom, especialmente pela gestão responsável, compartilhada e transparente. “Nossas lideranças e conselheiros indígenas realmente participam das decisões e do processo, o que faz com que nosso povo tenha muita confiança no trabalho”, relata, mostrando a importância da autonomia e do controle social.
Debô, no entanto, conta da dificuldade de fazer a integração do cuidado especializado indígena e da atenção básica com a média e alta complexidade ofertada por municípios e estado, uma dificuldade comum aos povos indígenas. “Quando precisamos disso, encontramos as portas fechadas”, diz. Debô reitera que é fundamental uma Sesai independente, que garanta autonomia local e atenda cada povo de acordo com sua especificidade. “Queremos acompanhar o trabalho de perto, cobrar através do controle social e das lideranças. Esse sistema de hoje, mesmo com suas falhas, fortalece a cultura e trabalha na ponta, se preocupa desde o bebê na barriga da mãe até o idoso. A Sesai é uma conquista dos indígenas de todo o Brasil e queremos mantê-la e melhorá-la”.
O clima na Secretaria, contudo, é de apreensão. “É tudo muito não transparente. Todo mundo acordou um dia e tinham revogado praticamente todo o sistema (pela Portaria 1.907/16), não houve diálogo e a mobilização indígena deu a resposta. Não dá para ter clareza e confiança do que esta gestão quer”, afirma Rodrigo.
Jéssica* trabalha em uma divisão estratégica da Sesai desde a sua fundação e confirma: “Trabalhamos com incertezas por conta desses atropelos e não temos muito o que fazer. Estamos inseguros, tudo pode mudar de um dia para o outro por conta da orientação de algum parlamentar. Essas interferências acontecem muito”, relata a trabalhadora da Sesai. Jéssica reconhece o que os indígenas sentem na ponta: a precariedade do serviço, a medicalização dos indígenas, a perda de práticas tradicionais de saúde. “Isso é uma coisa que não conseguimos conciliar bem, entramos forte com o nosso olhar e não conseguimos fazer uma interlocução de trabalho com outras formas de cura”, admite.
Ela reforça o peso dos interesses políticos contrários aos indígenas. “Tem muito da bancada ruralista aqui dentro, de uma forma ou outra querendo ocupar esses espaços. Está mais forte a distribuição de cargos para pessoas muito ligadas a interesses contrários”, revela. Rodrigo concorda: segundo ele, para melhorar é necessário uma reorganização da gestão administrativa, mais transparência na prestação de contas, mais participação do controle social, seja ele exercido pelos mecanismos institucionais seja o Conselhos Distritais de Saúde Indígena (Condisi), o movimento indigenista ou a população em geral. Algo que parece pouco provável de acontecer considerando a interferência política direta no órgão.
A autonomia, diz Rodrigo, hoje é de fachada. “Os distritos teoricamente são autônomos mas não exercem essa autonomia. Tudo precisa de um aval, de um nível central”, conta. A morosidade nos processos e na elaboração de políticas adequadas para a cada realidade também impactam na gestão hídrica e de saneamento das aldeias, uma atribuição da Sesai que avançou pouquíssimo desde que foi fundada e uma questão com impacto direto na saúde dos povos indígenas, especialmente as crianças e na atenção básica.
Recursos humanos: modelo em debate
Atualmente, boa parte das contratações dos profissionais em saúde indígena são terceirizadas, firmadas através de convênios com entidades diversas. A falta de um norte específico e a situação única de quem trabalha na área impõe desafios nas diferentes regiões do país e suas realidades locais: profissionais que se deslocam dias de barco para atender comunidades indígenas e ficam em regime de plantão permanente, por exemplo, não tem amparo legal. Problemas que afastam muitos profissionais da área, aumentam a rotatividade, contribuem para a privatização da saúde e ensejam debates acalorados sobre o melhor caminho a seguir.
Por isso, lideranças indígenas de todo o Brasil colocaram a saúde como uma das principais pautas do 14o Acampamento Terra Livre em Brasília, apresentando o que tem sido debatido e decidido nos grupos de trabalho locais. Com o modelo de contratação de pessoal em foco, foi relatado o que cada DSEI resolveu sobre a política de recursos humanos (veja detalhes nas imagens abaixo). Para eles, o maior desafio da política de recursos humanos da Sesai é viabilizar o apoio à capacitação dos profissionais indígenas nos níveis básicos, como agentes indígenas de saúde e de saneamento, nível técnico de saúde e no nível superior com garantia de acesso às universidades. Para Uwira Xakriaba, presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi) de Altamira no Pará, a maior dificuldade hoje é o desentendimento do tema saúde indígena por quem trabalha com saúde.
“Nosso sistema devia trabalhar com prevenção e promoção da saúde, mas na verdade funciona como bombeiro apagando incêndio. Ela desarticula nossos modelos tradicionais de saúde”, afirma. Uwira também relata que a ingerência política também faz com que pessoas ocupem cargos estratégicos sem nenhum conhecimento do tema, apenas por apadrinhamento político. “Coordenadores distritais escolhidos por deputados A ou B caem de paraquedas, não fazem seu trabalho de gestão e inviabilizam nosso trabalho de controle social. Esse é um entrave, a SESAI precisaria ter autonomia”, reitera.
De modo geral, os povos indígenas reivindicam:
– Contratação e valorização dos profissionais indígenas indicados e residentes nas comunidades, como Agentes Indígenas de Saúde (AIS), Agentes Indígenas de Saneamento (AISAN) e Técnicos Indígenas de Enfermagem, Laboratório, Saúde Bucal e Combate a Endemias;
– Processo de seleção dos profissionais diferenciado e regionalizado, que valorize e assegure os critérios da experiência prévia de trabalho nas comunidades, adequação cultural e respeito às comunidades e lideranças, e compromisso com os princípios da saúde indígena;
– Participação das instâncias de controle social da saúde indígena – Conselhos Locais e Distrital, e Fórum dos Presidentes de Condisi – no processo de seleção e definição das formas de contratação dos profissionais em suas respectivas regiões e distritos;
– O modelo de contratação dos recursos humanos para a saúde indígena deve ter como base o fortalecimento do controle social, a gestão participativa e a autonomia administrativa e financeira dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs);
– Os profissionais indígenas residentes nas comunidades, como Agentes Indígenas de Saúde (AIS), Agentes Indígenas de Saneamento (AISAN), e Técnicos de Enfermagem, Laboratório, Saúde Bucal e Combate às Endemias devem ser indicados pelas comunidades, a partir de requisitos técnicos pré-estabelecidos e da exigência de moradia na sua região de atuação.
Na avaliação de José Damião, presidente do Condisi Interior Sul, que representa os estados de RS, SP, PR, SC, as discussões do modelo de contratação tem avançado, mas é preciso recurso e respeito por parte do governo. “A discussão está boa, nós fizemos os Planos Distritais de Saúde Indígena, mas o governo tem que garantir recurso porque sem isso não conseguimos ter um PDSI que realmente funcione e é por isso que viemos a Brasília”, diz.
Na avaliação de alguns indígenas, um concurso público diferenciado e regionalizado poderia ser feito para atender a área meio nas funções de gestão dos DSEIs, acontecendo ao mesmo tempo em todos os distritos, com a garantia de contratação preferencial dos profissionais indígenas. Os convênios com organizações sociais (OS) de direito privado não são bem vistos pelos povos, pois impedem o exercício do controle social pelos Conselhos Distritais e fiscalização por parte do Ministério Público Federal (MPF). Este modelo facilita as ingerências políticas nocivas ao interesse da saúde indígena.
Rodrigo, da Sesai, confirma. “É uma terceirização. Essa organização social só contrata, não tem nenhuma responsabilidade, não dá condições para as ações serem realizadas. Como fica? É só uma barriga de aluguel, não tem poder inclusive de garantir qualidade das condições de trabalho necessárias. Quem responde legalmente sobre os problemas trabalhistas de periculosidade, acidente de trabalho etc? Além disso, muitos convênios não são claros sobre os processos seletivos, permitindo que haja uma influência política que não necessariamente é voltada para critérios técnicos”, denuncia. Para Rodrigo, basear-se na experiência exitosa de outros órgãos públicos espalhados pelo Brasil que tem regimento interno para garantir profissionais trabalhando no interior e em locais de difícil acesso, com jornada e situações específicas, seria um caminho. Além do plano de carreira, inexistente. “Hoje não existe perspectiva de crescimento. Um profissional recém formado entra e pode passar anos na saúde indígena e não tem um plano de carreira, um recém contratado ganha o mesmo que alguém com experiência. As dinâmicas de trabalho nas diferentes regiões não são levadas em conta”, reclama.
Problemas e divergências que o modelo atual ainda está longe de oferecer solução.
Muitos caminhos, pouco entendimento
Wilses Tapajós formou-se em medicina na Universidade Federal do Tocantins e trabalhou por 3 meses na Ilha do Bananal, também em TO, a maior ilha genuinamente fluvial do mundo, que concentra três terras indígenas diferentes e abriga os povos Carajás, Javaés, Tapirapés, Tuxás e os Avá-Canoeiros. Depois desse tempo, participou do programa Mais Médicos fazendo a supervisão das aldeias e enfrentou resistência ao ter que denunciar situações que vivia. “Eu reportava ao MS o que acontecia e, como profissional indígena, é muito difícil por exemplo ver uma parenta minha com sífilis sem ser tratada, faltando todo o suporte necessário. Ao denunciar isso, às vezes você é vista com desconfiança e não como aliada. É um pedido de ajuda”, diz.
Hoje, por essas e outras situações, Wilses trabalha na atenção básica da capital, Palmas. E ela questiona: porque tanta diferença? “Porque que na aldeia não dá certo? É o mesmo dinheiro, o mesmo modo de atenção. Peço perdão aos parentes porque não estou mais na saúde indígena porque não tive o apoio que precisei. Participei dos conselhos e minha postura sempre foi crítica e continuará sendo”, afirma. Profissionais que precisam levar sua própria comida, seu botijão de gás, em condições precárias, sem apoio institucional e vivendo sob desconfiança, essa é a história que Wilses conhece bem e que, como ela, afasta tantos profissionais da saúde indígena.
Situação corroborada por Marquinhos Carajás, que vive no norte do Tocantins, na região do Bico do Papagaio. “Os profissionais indígenas são os que mais trabalham e não tem folga, feriado, suporte adequado, nada. Além disso, a organização de cada povo é bem diferente. Por exemplo, na minha região tenho 4 mil indígenas divididos em 90 aldeias. Iria precisar de 90 agente de saúde e tenho só 30”, conta. Jéssica, da Sesai, concorda que o contexto geral de entorno dos indígenas mudou muito e que a secretaria não conseguiu acompanhar. “O Mais Médicos foi um avanço importante, mas os médicos encaminham muito para a cidade situações que poderiam ser resolvidas na própria aldeia, do jeito deles. Precisamos de uma preparação melhor”, diz.
Paulo Nukini, presidente do Condisi do Alto Rio Juruá, no Acre, confirma que a saúde chega em cada distrito de uma maneira, com um desafio especial para a população ribeirinha. “A qualidade não é uniforme em todas as regiões e o estado ainda não conseguiu fazer com que chegasse saúde de qualidade para os ribeirinhos, mas estamos avançando. A fiscalização do Conselho Distrital e o controle social geral são fundamentais. Graças a isso que hoje temos médico, enfermeiros, técnicos de saúde”, reitera.
Paulo é contra concurso público para área fim, porque recebem pessoas que desconhecem totalmente a realidade local e abandonam os postos assim que possível, deixando a comunidade sem profissional. Sobre os ataques contínuos que a Sesai vem sofrendo, Paulo faz questão de lembrar que foi a mobilização indígena que manteve o modelo atual vigente, com todos seus problemas, mas avanços significativos. Ele foi um dos líderes das manifestações que levaram 11 mil indígenas para as ruas do Brasil exigindo a manutenção da Sesai. “Aquela portaria foi um ato de traição, de covardia do ministro. A Sesai foi criada pela população indígena e não vamos aceitar nenhum retrocesso. É bom que isso fique claro para todos”, finaliza.
Massacrados historicamente por todos os lados e lutando contra tudo e (quase) todos, a mobilização dos povos indígenas é um exemplo para uma sociedade que vê seus direitos adquiridos serem arrancados dia a dia pelo Congresso mais corrupto e reacionário desde o golpe militar. O Sistema Único de Saúde (SUS), enfraquecido e cada vez mais privatizado, é a prova concreta disso.
*Os nomes dos funcionários da SESAI citados são fictícios, preservando a identidade das fontes, em entrevistas concedidas em off.